Resenha: O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry | Entre Páginas e Prateleiras

“Le Petit Prince”, ou “O Pequeno Príncipe”, é uma obra atemporal do escritor e aviador aristocrata francês Antoine de Saint-Exupéry, cuja narrativa supera a mera categorização infantil. Originalmente publicada em inglês e francês, em abril de 1943, nos Estados Unidos; esta obra oferece uma reflexão profunda sobre a complexidade da existência e as verdades fundamentais que frequentemente negligenciamos na vida adulta.

Nessa resenha crítica, examinaremos as camadas filosóficas e os detalhes intrincados que transformam essa obra num farol de sabedoria e contemplação.

Imagem: Fonte: www.jaquelinelima.com


Saint-Exupéry habilmente nos lembra da importância de manter a inocência e a simplicidade que caracterizam a infância. O Pequeno Príncipe, com sua perspectiva descomplicada, questiona e desafia as complexidades e convenções do mundo adulto. Sua visão oferece um lembrete crucial de que a verdadeira sabedoria amiúde é encontrada na simplicidade da infância, apesar de sua natureza efêmera.


Cada planeta visitado pelo Pequeno Príncipe representa um aspecto da natureza humana e da sociedade, funcionando como metáforas. Personagens como o rei que governa sem súditos, destacam a vaidade do poder. Enquanto o vaidoso que anseia por admiração sobre os perigos da busca desenfreada por aprovação externa. Cada personagem é uma encarnação de uma característica ou fraqueza humana. Essas representações convidam à reflexão sobre nossos próprios comportamentos e motivações.


O significado dos baobás é um ponto culminante de visão filosófica, utilizando essas árvores como símbolos dos problemas que, se negligenciados, podem crescer a ponto de destruir o que é valioso em nossas vidas. É uma lição poderosa sobre a importância de cuidar de nossos “baobás”, ou seja, de enfrentar nossos problemas antes que se tornem insuperáveis.


A inserção do narrador como personagem também é um toque genial da narrativa. Esse elemento metaficcional destaca a natureza atemporal da história, e sugere que o Pequeno Príncipe pode ser encontrado em cada um de nós, independentemente da idade ou da experiência.


A relação entre o Pequeno Príncipe, a raposa e a flor em seu pequeno planeta, o qual é um tipo de asteroide, é um estudo complexo sobre os matizes do amor, do cuidado e do apego. A flor, embora caprichosa e exigente, é objeto de um afeto profundo por parte do príncipe, uma devoção inabalável. Nesse contexto, a figura da raposa, associada no ocidente a um animal matreiro, astucioso, esperto e dissimulado, emergirá como uma mentora, cheia de sabedoria, que guiará o Pequeno Príncipe no rito da amizade e do amor. A expressão deveras marcante: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”, em francês: “Tu deviens responsable pour toujours de ce que tu as apprivoisé”, revela a complexidade da relação entre cativar e ser responsável.

Daí surge uma ponderação um tanto quanto intrigante: não estaria o autor ironizando a suposta “bondade” da raposa, já que ela é um animal símbolo da desconfiança? A escolha do verbo “cativar” para traduzir “apprivoiser” do francês, em detrimento de suas múltiplas semânticas, como “domar” ou “domesticar”, é uma escolha digna de reflexão. “Cativar” evoca a ideia de “cativeiro”, aquilo que aprisiona ou confina alguém, ou alguma coisa.

Dessa forma, compreendemos que a amizade e o amor não são entidades em si; mas laços que, se não manejados com cuidado, podem se transformar em “cativeiros”. Somos cuidadores, cuidadores da terra, das flores, dos seres vivos, da linguagem e até de nós mesmos. Cuidar é a nossa atividade, é a atividade do homem. Heidegger já afirmou que o homem é um pastor do ser, é incumbido de cuidar daquilo que é, ao fazer, na Cura, a experiência da existência. Assim, nós somos, por extensão, os cuidadores daqueles que cativamos, que pomos em “cativeiro”. A dinâmica do texto, então, acompanhado dessas nossas indagações, faz-nos refletir profundamente o significado e a natureza do amor, assim como a importância de aceitar as imperfeições das pessoas que amamos.


“O Pequeno Príncipe” de Antoine de Saint-Exupéry é uma obra que transcende gerações, oferecendo um olhar profundo sobre a essência da vida e da humanidade. Cada personagem e cada metáfora é uma janela para a alma humana, nos convidando a refletir sobre nossos próprios valores, relacionamentos e a busca por significado. Esta obra é um tesouro literário e filosófico, capaz de enriquecer e iluminar qualquer pessoa disposta a se deixar envolver por sua magia atemporal.




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